sábado, 28 de junho de 2008

Carteada sobre commodities

Confesso que estou sem saco de fazer a analise dos balanços das contrutoras.
No lugar disso, resolvi fazer um tópico para cartear os motivos para a alta das commodities. Viajei um pouco, mas faz sentido. Primeiramente vou explicar como funciona o mercado de futuros. O comprador de óleo compra um contrato futuro, que dá direito a comprar no dia tal petróleo a tal preço (o equivalente às opções das ações). O vendedor opera vendido, e, assim, fazem hedge, em vez de ficar ao belprazer do mercado. Os especuladores entram para dar liquidez à estes contratos. Sem eles, não existiria esse tipo de transação financeira. Há um contrato para cada mês do ano, até uns 10 anos à frente. Comprando contratos futuros, então, eu compro commodities que ainda não existem.

Vou agora voltar um pouco no tempo, depois vocês vão entender porque. No começo, não havia moeda, havia mercadoria. Os metais preciosos funcionavam como moeda, mas eles não eram signos, era o valor em si. "É preciso que o valor da moeda seja regulado pela massa metálica que ela contem; isto é, que retorne ao que era outrora, quando os príncipes não tinham ainda imprimido sua efígie nem seu selo sobre fragmentos metálicos; naquela ocasião, "nem o cobre, nem o ouro, nem a prata eram monetizados, mas estimados somente segundo seu peso"; não se fazia valer signos arbitrários por marcas reais; a moeda era uma justa medida, porque nao significava nada mais que seu poder de aferir riquezas a partir de sua própria realidade material de riqueza." (Michael Foucault, As Palavras e as Coisas). De certa forma, esta forma de pensar, mesmo após a criação do dinheiro, continuou. No século XX, os EUA se comprometeram a manter paridade de sua moeda com o ouro. Isto significa que mesmo sendo papel moeda, o dolar tinha uma representação concreta, pois havia uma relação direta do seu valor com o valor do ouro.
Os EUA abandonaram esta paridade, porem, como unica potencia capitalista do mundo o dolar, de certa forma, virou uma riqueza, à moda dos metais na época do mercantilismo. De alguns anos para cá, o dólar vem sofrendo severa desvalorização, e, para completar, os títulos de vencimento de 2 anos estão rendendo menos que a inflação. Ou seja, quem tem dinheiro investido em bônus dos EUA, estão perdendo dinheiro 2x. Uma com a desvalorização perante outras moedas e outra com a própria inflação americana. Há então uma crise, pois quem "investe" em títulos do governo americano, está vendo seu dinheiro ir embora. Neste grupo, se incluem grandes fundos de pensões, que precisam de uma âncora (eles não podem, simplemente, jogar esse dinheiro no mercado de ações). Eles tambem nao estão podendo investir em títulos de hipoteca (ver tópico abaixo), pois há uma crise nesse setor . Qual a resposta que eles adotaram? Migrar para as commodities.

Há então, uma grande migração do dinheiro investindo em títulos do governo e hipotecários para contratos futuros de commodities. Desse jeito, os investidores fazem hedge contra a inflação. Contratos para daqui a 5, 10 anos, que mal eram usados, estão sendo comercializados a um volume cada vez maior. Comprando uma maçã a ser entregue em 2010, por exemplo, não importa a inflação que exista, uma maçã terá seu preço corrigido. Acontece que há um problema neste movimento. O mercado real de commodities é muito pequeno. Uma única grande empresa especuladora de petróleo é capaz de trocar no ano várias vezes a quantidade mundial de óleo produzida. Uma avalanche de dinheiro aumenta, e muito, seu valor (imaginem um mico que de repente vira a única proteção contra a inflação, e todo mundo passa a comprar ele). Esse movimento é auto alimentavel, pois quento mais se migra, mais se aumenta a inflação.

Conclusões:
1) A nova moeda mundial não é o dólar, é o petróleo.
2) Um aumento dos juros norte-americanos reduz a inflação de duas maneiras. A tradicional, e a outra trazendo de volta investidores, baixando as commodities.
3) Enquanto os juros continuarem baixos, o cenário vai continuar.
4) Não sei se os investimentos em commodities vieram para ficar. Se eles são temporários, ou seja, se os grandes investidores acharem mais tarde que o dólar está mais vantajoso, pode estourar uma bolha, das grandes.
5) O preço das commodities está intimamente ligado à saude economica norte-americana.
6) Paradoxalmente, voltamos aos primórdios do capitalismo. Os instrumentos complexos do sistema permitem que as riquezas voltem a ser medidas por seu valor em si, não em uma moeda.

Um comentário:

Tiago Ferraz disse...

Albertão,

Só um detalhe. Não sei se o simples aumento de juros vai ser suficiente pra desinflar as commodities. Isto porque existe o problema do déficit fiscal americano. Já começo a ver alguns questionamentos sobre a real capacidade de solvencia da dívida, nos termos atuais. Uma elevação dos juros, sem uma contrapartida no controle do déficit pode ser insuficiente. A conferir.
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Temujin